No tempo dos homens das cavernas (assim mesmo, de forma historicamente inexacta e cronologicamente vaga) não havia tempo para desgostos de amor.
Não havia tempo para ciumeiras, nem para joguinhos, nem para traições, nem para arrebatamentos, nem para serenatas, nem para reconquistas. O tempo que havia era para comer, para dormir, para acender fogueiras, para afastar predadores e para procriar.
No tempo dos homens das cavernas ninguém tinha vagar de se pôr chorar ou a sentir-se vazio e injustiçado porque o ente amado escolheu outro. Talvez nem houvesse entes amados. Talvez o amor seja puramente uma construção humana. Afinal, com o fim da luta dura e crua pela sobrevivência houve necessidade de arranjar outros dramas para ocupar o tempo.
Com o surgimento desta nova e maravilhosa faceta de apaixonado, o Homo Sapiens tornou-se também mais mesquinho, mais elaborado, mais calculista e mais dissimulado. Deixou de haver técnicas de caça ao mamute, mas outras lhes sucederam. Deixou de haver mortes com calhaus à traição por um bocado de carne crua mas continuou a haver golpes igualmente imorais.
Eu já vim aprender tarde essa triste verdade que não faz passar fome, nem frio, nem condena a sobrevivência da espécie mas mói como se a vida se transformasse num campo de batalha sem regras, sem honra: não há encantamento, nem paixão, nem amor que nos garanta nada, mais tarde ou mais cedo todos vamos ser pisados e humilhados.
Não deve haver no reino Animal ser menos confiável do que o Homem, capaz de apunhalar pelas costas e vir justificar-se com instintos e inevitabilidades da sua condição imperfeita.
Resta-nos manter a esperança de encontrar, neste tortuoso caminho, Homo Sapiens dignos, que percebam que só porque todos fazem não quer dizer que esteja certo.
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