O meu estudo

Alice: And how many hours a day did you do lessons?

The Mock Turtle: Ten hours the first day, nine the next, and so on.

Alice: What a curious plan!

The Gryphon: That's the reason they're called lessons, because they lessen from day to day.


(From "Alice's Adventures in Wonderland" by Lewis Carroll)



Cidade das Meias-Palavras

Na cidade das meias palavras nada é dito por inteiro.

Tudo se presta a mais de uma dúzia de interpretações. As palavras nascem de uma forma e chegam ao seu destino transformadas, adulteradas, alheias ao seu significado original.

São ouvidas e armazenadas em miraculosas redes de conceitos, letras transformadas em impulsos eléctricos, emoções meticulosamente guardadas num mundo de moléculas.
Na ignorância do seu fulcral papel, propagam-se da mesma forma que o ruído dos carros, que a sirene das ambulâncias e que o rítmico pingar de gotas de uma torneira.

Tento lembrar-me das palavras inteiras, fazendo-as revolver todos os circuitos ao meu alcance na busca incessante do baú das memórias definitivas. Incontornavelmente atinjo o cansaço, os olhos pesam e as pálpebras descaem gentilmente como que fechando a porta a mais desvarios, a mais tentativas dolorosas de forçar aquilo que saturou.

Quero deixar de pensar. Por um segundo. Por um milésimo de segundo.

Mas este circuito busca outro, que encontra outro, que se cruza com outros mais, numa intransigente saga de revisitações. O egoísmo de querer estar sempre alerta.

Lembro-me de dar as mãos.
De querer ajudar alguém e não conseguir.
De ouvir calada as ignóbeis injustiças da vida e não poder fazer nada.

Se calhar são tudo meias palavras. Se calhar, simplesmente, não entendi.

Algumas pessoas dançam...




Um, dois, três...
Contagem rítmica do tempo,
Marca-passo do trabalho adiado,
Dos deveres cumpridos,
Das metas desejadas em segredo.


Três, dois, um...
Contagem decrescente da sanidade,
Entidades oníricas flutuantes,
Jogando o jogo do empurra
Até que as pálpebras caiam.


Dedos, autómatos de mim,
Premindo as ideias com força.
Um, dois, três...
Sequência inexorável das horas.


Ponteiros que não voltam para trás.

Incidentaloma!


Boa tarde a todos! :)

Vou começar por vos apresentar a supra renal, esta bela estrutura glandular situada acima de cada um dos nossos rins (aquela massa disforme amarela) que tem a fantástica função de produzir uma infinidade de hormonas importantes. Assim, se alguma desgraça acontecer com a vossa supra renal podem ter problemas variados como por exemplo: ficar com uma bossa de gordura tipo búfalo na parte de trás do pescoço, estrias violáceas espalhadas pela pele, cara em formato de lua cheia ou, também muito interessante, sinais exteriores de feminilização ou masculinização.

Hoje, enquanto estudava a vida íntima da supra renal e todas as formas mais ou menos invasivas de a remover do corpo humano, deparei-me com uma das mais estranhas entidades da Medicina - o Incidentaloma. Como o próprio (e estúpido!) nome indica trata-se de uma massa tumoral da supra renal encontrada por acidente quando se fazia uma ecografia ou TC do abdómen à procura de outra coisa qualquer que não tenha nada que ver com a supra-renal. E depois seguem-se páginas e páginas acerca da abordagem do incidentaloma (tratado portanto como uma entidade respeitável) basicamente retratando a forma como qualquer doutor deve "descalçar a bota" de ter encontrado uma massa inesperada quando andava à procura de outra coisa.

Toda a estupidez inerente a este tema (que me perdoem os estudiosos devotos do Incidentaloma) culmina com esta frase, que passo a transcrever:

"O maior factor de risco para o diagnóstico de um Incidentaloma é a investigação imagiológica do abdómen." - portanto, se não querem ter um cancro do pulmão não fumem, se não querem ter uma cirrose hepática não bebam álcool e, se não querem ter um incidentaloma não deixem ninguém fazer uma ecografia à vossa barriguinha! :p

Inspirei-me na Lua que tu sonhaste

"Dreaming moon" by Nair Diaz


De regresso aos momentos contemplativos.
Quando me faltam os olhos da alma tento entender o mundo que os outros vêem, que os outros sentem e que os outros registam, em imagens eternas compostas por aqueles segundos raros em que as cores da alma coincidem com as cores da noite.

E se agora os minutos se esgotam mais rápido do que a nossa vontade e as tarefas se sucedem sem trégua, não podemos deixar de levantar os olhos e ver as lágrimas e os sorrisos dos outros. As breves nuances de cada um de nós, na individualidade da nossa objectiva, no sentimento único que nos invade quando vemos a mesma extasiante lua que todos os outros.

Perdão por ter roubado esta lua, que todos veremos de forma diferente, mas que será sempre bela. Não deixem nunca de olhar.

Pop Art e muito mais...




Se andam a desesperar à procura de artigos decorativos originais lá para casa desafio-vos a visitar o site da Vertigo Store, que tem loja no Porto e que também vende na internet. Preparem-se para um vasto mundo de arte, de todas épocas e para todos os gostos com preços bastante acessíveis.

E mesmo que não estejam a pensar numa remodelação decorativa para os próximos tempos uma espreitadela a este site é sempre uma forma original de passar uns minutos do vosso tempo.

Mafalda


(sempre sábios lol em qualquer língua...)

Déja vu

A placidez de me encontrar em casa, a temperatura amena, contraste com o clima chuvoso lá de fora... Folhas espalhadas pela mesa, uma confusão organizada de ideias, umas em português e outras em espanhol, tantas verdades que eu devia saber e que se calhar não sei, que eu já li em tempos mas que se perderam na infinidade de conhecimentos que me obrigo a saber.

Estudar em tempos de preguiça e lassidão: tema recorrente das minhas reflexões. Uma sensação que só partilho verdadeiramente comigo própria, quando me encontro só, rodeada por um mundo de apontamentos, informações fugidias e efémeras que me esforço por amarrar com força à minha memória perene e que, tantas vezes, me escapam entre os dedos, de um dia para o outro. A terrível constatação do esquecimento, de querer fazer sempre mais, de não ter bem a certeza daquilo que já se fez.

E vocês que lêem os meus desabafos repetitivos, porque também estas fases de estudo são repetitivas, monótonas e castradoras da imaginação e da originalidade, talvez sintam algo parecido, que partilham convosco mesmo na solidão das horas de estudo.

"Agora fique calada!"

E assim falam as pessoas desbocadas que, algures no mundo da Medicina, buscam um palco para o paternalismo desapropriado.

É por esta senhora doutora e por muitos outros (alguns tão incrivelmente arrogantes) que os doentes têm medo do médico, escondem coisas, não regressam à consulta e não cumprem os tratamentos prescritos.

Quando pensamos na relação médico-doente tendemos a pensar em formas mais eficazes de melhorar a comunicação e a empatia duma relação, que no meu (ingénuo?) entendimento devia ser, por defeito, cordial e respeitosa. Parece que afinal o trabalho começa muito antes, na aprendizagem de que o doente é uma pessoa e, mais ainda, de que as pessoas, de uma forma geral, merecem respeito.

Por outro lado, começo a acreditar que devia haver uma cadeira obrigatória onde fossem correctamente leccionados os príncipios da humildade e do insight. É que ser médico não é ser Deus, ou criatura invulnerável e omnisciente que lança o seu véu pedagógico sobre os seres inferiores que buscam ajuda no consultório. Um médico não é um familiar próximo, não é um encarregado de educação, não é um pedagogo, não é um agente da autoridade, não é juiz, não é um ser inalcansável com múltiplos direitos e nenhum dever.

Para terminar, devo citar mais uma fascinante frase da doutora, referindo-se a um outro doutor, seu mestre na arrogância e presunção: "as pessoas não mudam, nós é que temos de nos adaptar". Portanto se conhecerem uma pessoa estupidamente cruel e desnecessariamente ofensiva mentalizem-se que ela nunca mudará, tentem simplesmente cumprir as suas expectativas ditatoriais e, com sorte, tornar-se-ão no futuro parecidas com ela.

Ou então, como eu, ignorem os comentários odiosos, aprendam com eles e escolham chegar ao fim do dia felizes por terem feito a diferença na vida de alguém, sem desrespeitar os seus direitos mais básicos. É que (para algumas pessoas isto pode ser uma revelação catastrófica!) para se curar ou ajudar alguém não é preciso ser desagradável ou desinteressado.

Tree of life!

by Laurent DeCuyper


A árvore da vida
Nasce num solo improvável.
Onde quer que a fertilidade
Abrace os deuses da criação.

Rectos ramos de seiva bruta
Estendem-se da segurança do tronco
Até onde o Sol os aqueça.

Ainda que o vento os fustigue
Com chicotadas de injúrias e veneno
Oscilam e não vergam porque são eternos.

Sopro gélido de um ente desalmado,
Curto e grosso na sua efemeridade,
Marca mais um anel e morre, para sempre.

Quando fôr quase centenário,
Prodígio no mundo das árvores,
Desdobrar-me-ei finalmente em histórias,
Em papel fino do meu tronco forjadas,
E devolvo-me ao chão onde nasci.

Estamos em Espanha?


Inspirem-se nas imagens e votem na mais recente sondagem!




...

E este é um daqueles dias em que mesmo antes de chegar a casa, enquanto percorria em passo rápido os curtos metros de calçada, imaginava o meu blogue a uma distância cada vez mais curta...


Em pleno desespero pelo encontro com as teclas, desejando que toda esta energia cinzenta me abandone, saia em rajada quando procuro no teclado as letras que me descodificam e as primo com firmeza, sem reler as linhas anteriores.


Fúria que me consome por dentro. Enquanto te uso como saco de boxe literário, escoando as minhas frustrações neste espaço em branco.


Se estivesse sozinha gritaria agora a plenos pulmões até que o chão debaixo de mim estremecesse e a dor aguda nos meus tímpanos me mostrasse que estou viva.

Lusco-fusco


Pela madrugada fora, no lusco-fusco de uma solidão premeditada...

Fuga de ideias

E a vida prossegue de forma pacata... sem sobressaltos apesar do novo ano ter chegado.

O meu sofá, que já era novo em 2008, permanece estático, indiferente a estalos de rolhas, cascatas de champanhe e uivos de alegria.
Pacientemente, abre os seus braços às minhas investidas sonolentas e abraça-me em almofadas e mantinhas quentes.


A TV murmura qualquer coisa sobre atentados e genocídios do outro lado do mundo, num sítio onde certamente não há tempo para celebrações e, concretamente, não haveria qualquer razão para que existissem: Novo ano. A mesma triste realidade.


Gostava de retocar o verniz vermelho mas não tenho paciência. De qualquer forma não consigo estar parada o tempo suficiente para que ele seque em condições. Por isso aqui fico, olhando para as abruptas transições de grená escuro, para os declives e encostas de tinta vermelha.


Por outro lado, reparo que passei do conflito armado para o verniz de unhas sem uma ponta de remorso, como se existisse uma qualquer associação pérfida entre sangue e verniz vermelho. Ou simplesmente a constatação da banalidade da morte, do massacre e do sofrimento, da pequenez de cada um de nós perante um mundo que, independentemente dos anos que passam, caminha para a desumanidade.



"Humanidade sintetiza as características partilhadas por todos os humanos, especialmente a capacidade do Homem para ser compreensivo e benevolente."

Nós, os humanos, estaremos extintos antes de desaparecermos. Deixaremos de ser humanos e passaremos a ter uma outra designação mais honesta, mais adequada à nossa natureza auto-destrutiva enquanto espécie.


E, assim, como em todos os anos, enquanto o Mundo parece caminhar para a calamidade total, cada um de nós, na sua microscópica existência, debate-se com todas as forças para ser feliz.


Do alto da minha cadeirinha falo para um gigante Universo de meia dúzia de pessoas... Sempre com a esperança de que as palavras possam mover pequenos grãos de areia ou grandes montanhas.



Parafraseando aquilo que já na minha infância parecia fazer sentido: