Na cidade das meias palavras nada é dito por inteiro.
Tudo se presta a mais de uma dúzia de interpretações. As palavras nascem de uma forma e chegam ao seu destino transformadas, adulteradas, alheias ao seu significado original.
São ouvidas e armazenadas em miraculosas redes de conceitos, letras transformadas em impulsos eléctricos, emoções meticulosamente guardadas num mundo de moléculas.
Na ignorância do seu fulcral papel, propagam-se da mesma forma que o ruído dos carros, que a sirene das ambulâncias e que o rítmico pingar de gotas de uma torneira.
Tento lembrar-me das palavras inteiras, fazendo-as revolver todos os circuitos ao meu alcance na busca incessante do baú das memórias definitivas. Incontornavelmente atinjo o cansaço, os olhos pesam e as pálpebras descaem gentilmente como que fechando a porta a mais desvarios, a mais tentativas dolorosas de forçar aquilo que saturou.
Quero deixar de pensar. Por um segundo. Por um milésimo de segundo.
Mas este circuito busca outro, que encontra outro, que se cruza com outros mais, numa intransigente saga de revisitações. O egoísmo de querer estar sempre alerta.
Lembro-me de dar as mãos.
De querer ajudar alguém e não conseguir.
De ouvir calada as ignóbeis injustiças da vida e não poder fazer nada.
Se calhar são tudo meias palavras. Se calhar, simplesmente, não entendi.
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