Para aqueles que vivem para sempre
Desabafo
As pessoas malucas deviam cumprir um recolher obrigatório! E por pessoas malucas entendo as criaturinhas que se passeiam aqui na rua a partir das onze da noite gritando a plenos pulmões numa linguagem alienígena para os meus ouvidos, soletrando álcool e substâncias psicotrópicas em cada pseudo-palavra que proferem.
Para que entendam melhor a minha revolta passo a explicar a dinâmica estabelecida a esta hora aqui em casa: eu tento estudar uma anotada de 40 páginas sobre arritmias (buscando uma forma de dar sentido àquilo que não tem) e para realizar essa tarefa, com o calor insuportável que se faz sentir, as janelas estão abertas e deixam entrar uma corrente de ar fresco. Ora, estão reunidas as condições para que aqueles grunhidos despropositados ecoem na minha sala, sem que nada se interponha entre as cordas vocais das criaturinhas e os meus ouvidos.
Já pensei diversas vezes em ligar à polícia mas desisto assim que antecipo o desprezo monumental que certamente me dariam: "Estou sim, queria fazer queixa de uns cidadãos que estão aqui na minha rua a blasfemar acima dos decibéis permitidos. Assim não consigo estudar a fibrilhação auricular nem o síndroma de Brugada nem os bloqueios Mobitz I e Mobitz II" - do outro lado da linha: "Desculpe?? Mobi quê? Olhe ponha uns tampões nos ouvidos que nós agora estamos a ver a novela e a pendurar posters da Nereida. Passe bem"
Ai ai, vou sonhar com traçados de ECG hoje...
Bonequinha
Chegou a noite e eu sentei-me a escrever. Um leve tom de melancolia ameaçou povoar as minhas frases, como se durante este longo dia tivesse gasto todos os meus sorrisos e o meu bom humor. Revejo-me na sofia de bata que fui durante a manhã, correndo e dando abraços, ansiosa por conquistar este mundo e o outro. Por vezes um sorriso sonhador, o olhar perdido entre uma nuvem cor-de-rosa e um pensamento impossível de concretizar.
Agora estou aqui sentada e demoro-me a pensar... Onde está a minha bonequinha de pano? A minha bonequinha de estrelas e de magia e de incenso? A bonequinha que tem o meu abraço e que interpreta o sonho no reflexo dos meus olhos? Estou triste porque a deixei sozinha num banco de jardim, entre as camélias e os malmequeres brancos, não me esqueci mas também não me lembrei, e ela chorou uma lágrima pequenina. E agora aqui estou, com uma pétala de flor cravejada no meu peito, a tricotar um vestido de purpurina e pirilampos para que ela me perdoe!
Agora estou aqui sentada e demoro-me a pensar... Onde está a minha bonequinha de pano? A minha bonequinha de estrelas e de magia e de incenso? A bonequinha que tem o meu abraço e que interpreta o sonho no reflexo dos meus olhos? Estou triste porque a deixei sozinha num banco de jardim, entre as camélias e os malmequeres brancos, não me esqueci mas também não me lembrei, e ela chorou uma lágrima pequenina. E agora aqui estou, com uma pétala de flor cravejada no meu peito, a tricotar um vestido de purpurina e pirilampos para que ela me perdoe!
Dermatologicamente feliz!
É bom renascer com os vossos sorrisos!!
Quando estamos juntos, estudar torna-se menos maçador, as pausas são mais divertidas e os momentos de desespero são quase insignificantes.
Qualquer coisa se abriu na minha mente, ainda não percebi bem se me está a tornar mais relaxada, mais feliz ou ambas as coisas mas sei que me sinto melhor lol
Esta saga diária que é a nossa vida, faz-nos personagens de uma história mais ou menos emocionante numas alturas e noutras um bocadinho mais monótona :) de qualquer forma quando não há nada de útil para contar podemos sempre recorrer a delírios sem sentido, ou à descrição do conteúdo dos sonhos para nos rirmos um bocado...
Agora estou aqui sozinha com as anotadas 'snif', dezenas de páginas em que tudo é prurido e descamação e mácula e mancha, sonhando acordada, imaginando quão bela seria a vida sem Dermatologia (e não sem pele, claro! lol isso era nojento!).
[Nota: lamento desde já o facto de o título deste post ser estranho e, ainda por cima, induzir o leitor a pensar que é a minha pele o sujeito da felicidade]
De pernas para o ar
Vou deixar a rua me levar
Não vou viver, como alguém que só espera um novo amor
Há outras coisas no caminho onde eu vou
As vezes ando só, trocando passos com a solidão
Momentos que são meus, e que não abro mão
Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar, e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora
Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
Eu vou lembrar você
É mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas, talvez você nem queira ouvir
Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar, e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora
Vou deixar a rua me levar
Há outras coisas no caminho onde eu vou
As vezes ando só, trocando passos com a solidão
Momentos que são meus, e que não abro mão
Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar, e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora
Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
Eu vou lembrar você
É mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas, talvez você nem queira ouvir
Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar, e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora
Vou deixar a rua me levar
Rubi
Menina dos sapatos vermelhos,
Dos olhos de raio de sol
E do vestidinho de roda rendado,
Teus tornozelos de rubi são jóias,
Que guardas à noite em segredo
No armário do quarto ao lado.
Assim sobes a escada dos sonhos
Nas pontas dos pés, sorrindo.
O medo ficou debaixo da cama,
Longe dessa voz que te aclama
E te impele pr'o infinito.
Bailarina do canto dos pássaros,
Canoa das manhãs de orvalho,
És chuva de prata e fogo
Que eu seguro nas mãos e espalho.
Flor de um jardim secreto,
Rasto de memória feliz,
Sobes a escada e não páras nunca,
Sobes a escada e não páras nunca,
Sobes até ao céu, amas, sorris.
Manifesto Anti-Estudo
Basta, Pum Basta!
O Estudo é uma seca.
Horas de Estudo são horas de morte lenta.
Estudo são milhares de folhas monótonas.
Estudo são milhares de folhas monótonas.
Estudo é a vida sem Sol e sem sorrisos.
Morra o Estudo, Morra! Pim!
Morra o Estudo, Morra! Pim!
Uma geração com este Estudo é uma geração zombie.
Estudo devia ser na toalha da praia ou na esplanada.
Estudo é a decadência da vida social.
O Estudo é uma seca.
O Estudo é uma seca.
Morra o Estudo, Morra! Pim!
[gostaria de pedir desculpa a José de Almada-Negreiros, onde quer que ele esteja, por este pavoroso plágio do seu hilariante texto]
Pediatria: Visita ao mundo que os adultos criaram para as crianças
Paredes largas, espessas, imponentes, cobertas de desenhos coloridos retratando de forma infantil um género que combina o surrealismo e a pura anarquia. Em cada sala um tema: os meninos "bonecos", os meninos "feiticeiros", os meninos "reis", os meninos "qualquer coisa que os adultos imaginam que uma criança gostaria de ser". Mas onde estão todos?
Ali! No jardim! É dia de festa. Há porquinhos e ratinhos e estrelas e tubarões surfistas a saltar por todos os lados, alguns mais talentosos projectam toda a sua psicomotricidade no palco improvisado. Alguns têm papás que não sabem sê-lo, papás que batem e que ofendem, papás que ignoram e negligenciam. Mas ali, naquele cenário de cartão e aguarela, elas são todas carochinhas e eles são todos mosqueteiros, metaforicamente reescrevendo a sua história rumo à felicidade.
Tudo é tumulto, uma confusão comovente de olhos límpidos e sorrisos desdentados, de bibes e de babetes, de bonés e de enfeites de cartolina. E nós somos um grupo de gigantes tentando entendê-los. As cadeiras são pequeninas, e as caminhas, e as mesinhas e todos os inhos e inhas que também vi mas já não me lembro. De repente sinto vontade de dançar também, de desenhar, de encolher e vestir um daqueles vestidos de princesinha. Da cozinha vem o cheiro do almoço, um cheiro que me é familiar...sim, cheiros que despertam memórias...eu conheço esta sensação!
Olho para cima e vejo todas aquelas pessoas grandes sem perceber o que fazem ali à hora da sopa. Corro para o meu lugar no fundo da mesa amarela, esgueiro-me na cadeira pondo os joelhos no assento e confirmo o meu nome no autocolante com passarinhos vermelhos:
S--O--F--I--A!
Ali! No jardim! É dia de festa. Há porquinhos e ratinhos e estrelas e tubarões surfistas a saltar por todos os lados, alguns mais talentosos projectam toda a sua psicomotricidade no palco improvisado. Alguns têm papás que não sabem sê-lo, papás que batem e que ofendem, papás que ignoram e negligenciam. Mas ali, naquele cenário de cartão e aguarela, elas são todas carochinhas e eles são todos mosqueteiros, metaforicamente reescrevendo a sua história rumo à felicidade.
Tudo é tumulto, uma confusão comovente de olhos límpidos e sorrisos desdentados, de bibes e de babetes, de bonés e de enfeites de cartolina. E nós somos um grupo de gigantes tentando entendê-los. As cadeiras são pequeninas, e as caminhas, e as mesinhas e todos os inhos e inhas que também vi mas já não me lembro. De repente sinto vontade de dançar também, de desenhar, de encolher e vestir um daqueles vestidos de princesinha. Da cozinha vem o cheiro do almoço, um cheiro que me é familiar...sim, cheiros que despertam memórias...eu conheço esta sensação!
Olho para cima e vejo todas aquelas pessoas grandes sem perceber o que fazem ali à hora da sopa. Corro para o meu lugar no fundo da mesa amarela, esgueiro-me na cadeira pondo os joelhos no assento e confirmo o meu nome no autocolante com passarinhos vermelhos:
S--O--F--I--A!
...
Preciso de ar fresco!! Real, genuíno, espontâneo.
Um balde de água gelada.
Umas braçadas no mar.
Uma corrida vertiginosa pela encosta verde.
Um salto de pára-quedas.
Um passeio pelas estrelas.
Um voo por cima do abismo.
Um abraço forte.
Um balde de água gelada.
Umas braçadas no mar.
Uma corrida vertiginosa pela encosta verde.
Um salto de pára-quedas.
Um passeio pelas estrelas.
Um voo por cima do abismo.
Um abraço forte.
Pegadas na areia molhada
No meu sonho, o crepúsculo é lilás e vermelho e o sol poisa delicadamente no recorte azul marinho do horizonte. No areal um vulto de luz desliza, a cauda do seu vestido comprido de lantejoulas turquesa forma uma rasto ténue e misterioso, o cabelo negro de carvão esvoaça livremente com a maresia, os olhos de uma cor indescritível que espelha as ondas e a cor do céu fixam um futuro invisível, muito além do pôr-do-sol. De mansinho, estende as mãos e os dedos delicados tocam a água gelada. Ergue-se novamente, recortando subtilmente o vazio humano da praia. Os olhos fecham-se e as narinas abrem-se ao cheiro da espuma salgada aproveitando o último sopro de luz do dia. Quando o sol desaparece e o lilás se converte em roxo profundo, a praia está novamente deserta.
Poema sem rimas
Vitral refractário de mil cores
Esta alma que me habita
E que nunca se esgota
De infinita imprevisibilidade.
Feita de lágrimas e sorrisos
Em vertiginosas transições
Que nem eu entendo.
Um dia sol e no outro lua,
Uma viagem que se repete
Cada manhã como se fosse a primeira
Numa eterna recapitulação da vida.
Sem espaço para o desespero
Recalco toda esta angústia
Para uma sombra de alma
Algures na profundidade da memória.
Resta um esboço de rosto
E um gesto largo de esperança
Tentativa de voltar a ser quem sou
Mas diferente de tudo o que sempre fui.
Esta alma que me habita
E que nunca se esgota
De infinita imprevisibilidade.
Feita de lágrimas e sorrisos
Em vertiginosas transições
Que nem eu entendo.
Um dia sol e no outro lua,
Uma viagem que se repete
Cada manhã como se fosse a primeira
Numa eterna recapitulação da vida.
Sem espaço para o desespero
Recalco toda esta angústia
Para uma sombra de alma
Algures na profundidade da memória.
Resta um esboço de rosto
E um gesto largo de esperança
Tentativa de voltar a ser quem sou
Mas diferente de tudo o que sempre fui.
Evening star
Fechar os olhos com força. Deixar a música embalar as profundezas da alma. Pensar num mundo élfico onde as casas são de cristal e oiro e os bosques são habitados por seres mágicos e deusas encantadas. Formar um rio invisível com todas as lágrimas choradas e remar numa canoa de esperança contra todas as marés.
"When the night is overcome
You may rise to find the sun"
You may rise to find the sun"
Estes dias...
Dias... Se eu pudesse revisitá-los daqui a muitos, muitos anos como seria?
Há pouco tempo descobri, não exactamente perdidos mas quase esquecidos, rascunhos que escrevi há muito tempo e durante muito tempo. Como numa espiral de semanas, meses e anos regressei à Sofia que era e procurei sentir o que ela sentia quando escreveu aquelas palavras. A dor que sentia, lembro-me bem. Como num ciclo, necessário mas tantas vezes injusto, revejo-me nesses momentos melancólicos, mais madura e sensata mas, ainda assim, tão igual à Sofia menina de antigamente.
Desta forma, mais ou menos mágica, no entanto tão concreta como aquelas folhas de papel e aqueles salpicos de tinta a Sofia do passado fala com a Sofia de agora e ambas se compreendem de uma forma única e intemporal.
Redescubro-me e ganho forças para me transformar, mais uma vez, na Sofia do futuro.
Há pouco tempo descobri, não exactamente perdidos mas quase esquecidos, rascunhos que escrevi há muito tempo e durante muito tempo. Como numa espiral de semanas, meses e anos regressei à Sofia que era e procurei sentir o que ela sentia quando escreveu aquelas palavras. A dor que sentia, lembro-me bem. Como num ciclo, necessário mas tantas vezes injusto, revejo-me nesses momentos melancólicos, mais madura e sensata mas, ainda assim, tão igual à Sofia menina de antigamente.
Desta forma, mais ou menos mágica, no entanto tão concreta como aquelas folhas de papel e aqueles salpicos de tinta a Sofia do passado fala com a Sofia de agora e ambas se compreendem de uma forma única e intemporal.
Redescubro-me e ganho forças para me transformar, mais uma vez, na Sofia do futuro.
História das estrelas - Lira
"Orfeu era o maior músico da sua época, e provavelmente de todos os tempos, pois era capaz de encantar pessoas e animais, pedras e correntes de água, apenas com as melodias que tocava na sua lira mágica. Numa das suas viagens apaixonou-se perdidamente por uma ninfa, Eurídice.
Um dia, a jovem foi atacada por Aristeu, filho de Apolo e da nereide Cirene. Ao fugir do atacante, pisou uma cobra venenosa que lhe mordeu, causando-lhe a morte. Orfeu ficou de coração despedaçado. Sentindo-se incapaz de viver sem Eurídice, resolveu descer até ao Mundo Inferior (o mundo dos mortos) para pedir que ela fosse libertada. Tratava-se dum pedido sem precedentes para um mortal, mas o som da sua música conseguiu amansar o perigoso cão de três cabeças Cérbero que guardava a entrada, e encantar o coração de Hades, o deus desse mundo. O poderoso Hades apenas pôs uma condição: no seu caminho de regresso com a esposa, Orfeu não poderia voltar-se para trás até estarem no exterior.
Orfeu não tinha alternativa e caminhou pela escuridão tentando guiar Eurídice com a sua música. No entanto, começou a recear estar a ser perseguido por um fantasma e não por ela. Já quase na saída voltou-se para a ver, o que fez com que a infeliz lhe fosse de novo arrebatada, desta vez para sempre. Orfeu ficou arrasado. A partir de então foi caminhando pelo mundo tocando a sua música.
Muitos anos depois, quando morreu, Orfeu acabou por ir finalmente para junto da sua amada Eurídice. E, segundo a lenda, as Musas colocaram a Lira no céu onde persiste até hoje como lembrança desta história de amor."
Hipnose
O sono chega, de mansinho, e eu tenho esta mania de o contrariar... De pedir só mais uns minutos de vigília e de obrigar os meus olhos a manterem-se abertos. Gosto que o dia termine só quando eu quero. Nesses instantes revivo vertiginosamente dias, semanas, meses... vejo-me a dizer e a fazer aquilo que já passou como uma espectadora da minha própria vida.
Compreendo, numa aparição destas horas hipnóticas, que quando perdemos aquilo que nunca pensámos perder e sobrevivemos podemos reconstruir do vazio um novo eu e um mundo onde tudo passa a ser possível.
Trabalhar para o bronze
À procura da inquietação
Sinto falta dessa gota de água, das ondas oscilantes que dela partem e se espalham, concêntricas, na plenitude do meu oceano. Hoje senti-me como as águas calmas de uma pequena lagoa, transparente, reflectindo passivamente a luz brilhante do sol. Estagnada, incapaz de fazer ondas contra a monotonia de um dia sem vento.
Onde está a gota de água que me perturba a paz destes dias? Aquela gota, que na sua simplicidade iria romper a superfície imaculada do meu tédio e relançar a vida que tenho cá dentro.
Help!
Um calor infernal lá fora e um calor ligeiramente menos infernal dentro de casa. Janelas abertas, ventoinha ligada e ainda assim este ambiente abafado que nos amolece e nos faz funcionar a metade da velocidade normal. Bebidas frescas, banho frio, deitar no chão e respirar fundo, vale tudo para mandar embora esta preguiça de origem metereológica.
Às vezes já nem sei bem se o calor vem de fora ou se emana de mim, depois de toda uma tarde a absorver graus centígrados e a rezar por uma brisa refrescante.
E assim se tenta estudar, languidamente: passa uma página, revê um conceito, sublinha uma frase. Agradece-se por a quarentena não incluir dores de cabeça (temos de ver algo positivo em tudo) e lamenta-se por não se poder vestir o biquini e correr para a piscina do prédio da frente.
É este diário monótono que partilho hoje, com toda a minha imaginação adormecida, sem grande ânimo e com uma triste carência de ideias.
Às vezes já nem sei bem se o calor vem de fora ou se emana de mim, depois de toda uma tarde a absorver graus centígrados e a rezar por uma brisa refrescante.
E assim se tenta estudar, languidamente: passa uma página, revê um conceito, sublinha uma frase. Agradece-se por a quarentena não incluir dores de cabeça (temos de ver algo positivo em tudo) e lamenta-se por não se poder vestir o biquini e correr para a piscina do prédio da frente.
É este diário monótono que partilho hoje, com toda a minha imaginação adormecida, sem grande ânimo e com uma triste carência de ideias.
Em pontas
Neste ténue equilíbrio em que vivemos, a cada momento uma leve e imprevisível brisa pode derrubar o castelo de cartas da nossa vida. Todos os planos e todas as certezas são voláteis e frágeis. Ainda assim, é extraordinária a beleza desse equílibrio, desse pedaço de perfeição que cada um de nós luta por construir a cada dia, contra todas as circunstâncias adversas.
Por uns segundos, somos pluma ou cristal de gelo ou pedaço fino de seda, pairando magicamente num mundo de tempestades. E esses segundos orientam todos os outros, são uma pequena e crucial variável na teoria do caos.
Entre a espada e a parede
Intervalo no estudo e aqui estou eu a testemunhar a preguiça e a lassidão que me percorrem. Quantos de vocês sentirão esta mesma dormência, esta mesma vontade de evitar os livros abertos e as folhas sublinhadas a marcador fluorescente?
Nestas alturas sinto-me quase literalmente dentro do provérbio "entre a espada e a parede", sendo a espada a possível consequência da minha negligência académica e a parede o acto doloroso de me dedicar ao estudo desta bela ciência que é a Medicina. De uma maneira mais simples e penso que mais fiel àquilo que eu sinto neste momento: para fugir de ser trespassada pela espada do chumbo e da humilhação choco sucessivamente (tipo filme do Charlot, sim) contra a parede entediante do estudo.
Estive a pensar e acho que o Ministério do Ensino Superior devia oferecer a cada um de nós um daqueles capacetes de realidade virtual e assim, nos intervalinhos do nosso estudo, para não se perder muito tempo, fingíamos de forma mais ou menos credível que estávamos na praia, ou na piscina, ou num passeio pelo campo. Eu acho que acabava por fazer uma figura menos triste (com o capacete na cabeça, a simular um mergulho na carpete da sala) do que aquela que faço horas sucessivas inclinada sobre as anotadas de Medicina I, numa postura que se começa a assemelhar perigosamente à do corcunda de Notre Dame (numa versão bastante mais feminina e sexy, pronto).
Depois deste desabafo mais ou menos delirante não me restam muitas alternativas que não incluam desligar a net e sentar-me de novo na minha mesa de trabalho.
A quem servir a carapuça, bom estudo! :p
Nestas alturas sinto-me quase literalmente dentro do provérbio "entre a espada e a parede", sendo a espada a possível consequência da minha negligência académica e a parede o acto doloroso de me dedicar ao estudo desta bela ciência que é a Medicina. De uma maneira mais simples e penso que mais fiel àquilo que eu sinto neste momento: para fugir de ser trespassada pela espada do chumbo e da humilhação choco sucessivamente (tipo filme do Charlot, sim) contra a parede entediante do estudo.
Estive a pensar e acho que o Ministério do Ensino Superior devia oferecer a cada um de nós um daqueles capacetes de realidade virtual e assim, nos intervalinhos do nosso estudo, para não se perder muito tempo, fingíamos de forma mais ou menos credível que estávamos na praia, ou na piscina, ou num passeio pelo campo. Eu acho que acabava por fazer uma figura menos triste (com o capacete na cabeça, a simular um mergulho na carpete da sala) do que aquela que faço horas sucessivas inclinada sobre as anotadas de Medicina I, numa postura que se começa a assemelhar perigosamente à do corcunda de Notre Dame (numa versão bastante mais feminina e sexy, pronto).
Depois deste desabafo mais ou menos delirante não me restam muitas alternativas que não incluam desligar a net e sentar-me de novo na minha mesa de trabalho.
A quem servir a carapuça, bom estudo! :p
Pesadelos (revisited)
Pesadelo! Outra vez! Mas porquê?? O conteúdo é repetitivo e já nem me perturba muito. O que me aborrece são todas estas noites mal dormidas, é toda esta ausência de descanso que me faz andar metade do dia a desejar ardentemente uma sesta e a outra metade a concretizar esse desejo.
[pintura: Contrasting sounds, Wassily Kandinsky]
Noites de Verão
Parece uma daquelas noites de Verão. Sinto qualquer coisa de mágico ao ficar aqui sentada no escuro, o ambiente quente mas não demasiado abafado, o chão fresco que me deixa suficientemente desconfortável para não ceder à preguiça e fechar os olhos. Inclino-me para trás e olho o tecto opaco, lá fora mil estrelas brilhantes devem ornamentar o céu de veludo.
Num instante nasce em mim a certeza de que o tempo parou algures e o céu e a terra se harmonizaram comigo num entendimento silencioso. Levanto-me e percorro o espaço até à janela, pé ante pé como se receasse acordar um monstro adormecido. O ar fresco entra pelo vidro entreaberto, suave mas surpreendente, como uma promessa de liberdade plena.
Retiro energia da brisa fresca e os meus lábios desenham um breve sorriso. Este momento nada me diz sobre o futuro mas tranquiliza a minha alma. Estamos quase no Verão.
Lembram-se?
Hoje à tarde regressei à minha infância... Durante a minha regressão temporária encontrei esta pérola :p um remix apimbalhado da música da pequena sereia. Ai ai... bons tempos... príncipes encantados e tal...
Pela noite dentro
Deixo-me cair nos lençóis macios. A luz azulada do ecran projecta-se, sozinha, no ambiente escuro do quarto, desenhando novos contornos e sombras. Já não tenho medo deste silêncio. As memórias tristes batem levemente à porta e entram devagar sem esperarem por uma resposta. Transformadas em fumo invisível preenchem o espaço e fundem-se com o próprio ar, envolvem-me e entram em mim em geladas golfadas de vento cada vez que respiro. Não me tiram o sono nem me comovem. Convertem-se em imagens desconectadas que nem me esforço por organizar, numa espécie de filme mudo dramático de má qualidade.
Bem longe daqui um outro fumo adensa-se e forma pequenos flocos negros, uma neve de culpa e solidão que nunca derrete. Alguém treme de frio. Dizem que cada um tem o que merece.
Já as minhas memórias tristes são só farrapos de nuvem, são só um fumo invisível que eu sopro pela janela e se perde na noite. Eu não tremo de frio.
Bem longe daqui um outro fumo adensa-se e forma pequenos flocos negros, uma neve de culpa e solidão que nunca derrete. Alguém treme de frio. Dizem que cada um tem o que merece.
Já as minhas memórias tristes são só farrapos de nuvem, são só um fumo invisível que eu sopro pela janela e se perde na noite. Eu não tremo de frio.
Sonhos
Estava aqui sentadinha no meu mítico sofá, perto da minha também mítica janela (agora está escuro, só se vêm luzinhas acesas e ecrans de TV) a decidir o que escrever quando me apercebi, tristemente, que a única coisa em que verdadeiramente consigo pensar é na vontade premente que tenho de dormir. Dormir, dormir... Eu que sempre fui incapaz de dormir sem ser no período nocturno agora deparo-me frequentemente com uma inabalável sonolência diurna (que me fez colapsar hoje de tarde neste mesmo sofá).
A introspecção possível, dada a tendência dos meus olhos para se cerrarem e do meu pensamento para estagnar no tempo e no espaço, permitiu-me concluir que os igualmente míticos pesadelos (que persistem, sim) devem estar a contribuir certamente para esta minha nova vertente zombie.
Fico portanto com a sensação frustrante de que sonhos deveras "fascinantes", como ser perseguida por um urso castanho gigante num castelo (!), me custam a capacidade de estudar decentemente e de me manter vigil nas tarefas mais básicas.
Para tentar esclarecer esta minha dinâmica onírica consultei sites muito fidedignos (cof, cof) dedicados à interpretação de sonhos e descobri que ser perseguido por um urso indica que "amigos falsos poderão colocar-me sérias dificuldades" (o que é sempre bom saber) ou então, segundo outro site igualmente credível, "sonhar com um urso indica que em breve receberei boas notícias" (lol). Perante a concordância destas interpretações fiquei profundamente esclarecida, claro.
Espero sonhar com um animal mais consensual hoje :)
[pintura: Dreamy Improvisation, Wassily Kandinsky]
Sexta-feira
Tenho o prazer de anunciar a contratação da Sexta-Feira como dia oficial dos momentos felizes podendo, obviamente, haver uma extensão desta alegria aos outros dias caso demonstrem interesse.
O acima referido entra em vigor já amanhã esperando-se um tempo metereologicamente favorável aos passeios, às conversas com os amigos, às gargalhadas e, de uma maneira geral, à diversão.
Be happy! :)
Procura-se!
Procura-se dia solarengo e radioso preenchido de sorrisos desde o nascer até ao pôr do Sol, sem momentos de tristeza ou decepção. Os dias candidatos devem ter uma duração nunca inferior a 24 horas e devem estar disponíveis para assinar contrato durante vários meses ou anos.
Os dias interessados devem deixar uma breve mensagem de candidatura neste mesmo blog.
Obrigado
Os dias interessados devem deixar uma breve mensagem de candidatura neste mesmo blog.
Obrigado
Sorte, onde estás?
Hoje estou à espera. Desde manhãzinha que me sinto na expectativa de qualquer coisa importante, marcante, feliz. Até agora ainda nada de extraordinário aconteceu mas continuo à espera. Amanhã surgirão mais 24 horas de oportunidades, cada minuto pode trazer uma coincidência feliz ou uma manobra arriscada do Destino.
Esta sensação traz consigo a vontade de sorrir para o mundo na esperança que ele retribua, de surpreender pela positiva, de ver o Sol logo pela manhã e não ter medo de ser iluminada por ele. Vontade de sair bonita e perfumada e elegante. Vontade de deslizar pelas horas do dia como se o chão fosse feito de nuvens. Vontade de trabalhar apaixonadamente por uma causa esperando encontrar, também aí, uma razão para estar viva.
Deixo a minha mente aberta para o feliz acaso, para a sorte que eu sinto a aproximar-se e que hei-de merecer.
Esta sensação traz consigo a vontade de sorrir para o mundo na esperança que ele retribua, de surpreender pela positiva, de ver o Sol logo pela manhã e não ter medo de ser iluminada por ele. Vontade de sair bonita e perfumada e elegante. Vontade de deslizar pelas horas do dia como se o chão fosse feito de nuvens. Vontade de trabalhar apaixonadamente por uma causa esperando encontrar, também aí, uma razão para estar viva.
Deixo a minha mente aberta para o feliz acaso, para a sorte que eu sinto a aproximar-se e que hei-de merecer.
Fui ridícula?! Pois fui
Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas).
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas).
Álvaro de Campos
O post que era para ser outro
Aqui estou.
Pensei em refugiar-me no silêncio do meu quarto para escrever. Já me tinha imaginado a percorrer o corredor semi-iluminado, a arrastar o puff vermelho para perto da janela e a ligar o candeeiro da mesa de cabeceira. Depois, essa ténue luz reflectiria o tom laranja da cortina e da colcha e expandir-se-ia pela divisão como uma enorme chama. Sentada entre as sombras e as labaredas, nesse santuário secreto da vida moderna, escreveria palavras diferentes destas. Talvez toda essa envolvência me deixasse triste, provavelmente despertaria memórias que não quero reviver e este post seria mais melancólico. Se calhar escreveria a palavra lágrima ou mágoa ou saudade ou raiva ou dor ou frustração.
A verdade é que não cheguei a levantar-me da poltrona da sala, não percorri o corredor nem arrastei o puff. O candeeiro do meu quarto continua desligado. Se lá vivem memórias agora, vivem nas cinzas e na penumbra. O meu quarto, íntimo de mim e dos meus desgostos, está agora na escuridão. E assim escrevi este outro post, no fundo tão parecido com o que poderia ter sido. No fundo tão parecido comigo.
Pensei em refugiar-me no silêncio do meu quarto para escrever. Já me tinha imaginado a percorrer o corredor semi-iluminado, a arrastar o puff vermelho para perto da janela e a ligar o candeeiro da mesa de cabeceira. Depois, essa ténue luz reflectiria o tom laranja da cortina e da colcha e expandir-se-ia pela divisão como uma enorme chama. Sentada entre as sombras e as labaredas, nesse santuário secreto da vida moderna, escreveria palavras diferentes destas. Talvez toda essa envolvência me deixasse triste, provavelmente despertaria memórias que não quero reviver e este post seria mais melancólico. Se calhar escreveria a palavra lágrima ou mágoa ou saudade ou raiva ou dor ou frustração.
A verdade é que não cheguei a levantar-me da poltrona da sala, não percorri o corredor nem arrastei o puff. O candeeiro do meu quarto continua desligado. Se lá vivem memórias agora, vivem nas cinzas e na penumbra. O meu quarto, íntimo de mim e dos meus desgostos, está agora na escuridão. E assim escrevi este outro post, no fundo tão parecido com o que poderia ter sido. No fundo tão parecido comigo.
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