Seine

C'est la vie!

É assim mesmo, a vida corre inexoravelmente o seu caminho, como um rio. Margens verdejantes, margens desérticas, pontes, barcos... Nada faz mudar o percurso pré-destinado, cravado na Terra ao longo dos séculos, dos milénios.

As decisões moldam, contudo, a forma como fazemos a viagem. Como será o mar de amanhã, agora que tantas decisões foram tomadas?


Reflexão (de mim para todos)

Quando muitas pessoas se unem e fazem o possível e o impossível para levar a bom porto um grande evento, tornam-se mais próximas, criam laços, sentem o orgulho de ter participado em algo grande!

Eu tenho pena, imensa pena, de não tê-lo feito na noite da medicina deste ano (do meu ano), de não poder subir ao palco e abraçar aquelas pessoas que são os meus colegas simplesmente porque não estive lá, na preparação, para criar laços ou para os reforçar.

Na verdade, arrependo-me de ter tido uma atitude um tanto ou quanto autista em algumas fases do curso, de ter dado demasiada importância àquilo que era suposto saber e não àquilo que tinha vontade de fazer. Os bons momentos passam-se em grupo, e não é só quando alguém faz anos ou na altura do Natal, mas sim em qualquer altura, só porque sim, dando o benefício da dúvida às pessoas que nos rodeiam e que tantas vezes não nos damos ao trabalho de tentar conhecer.

Depois de ter enchido o blog da Sandra com estas minhas reflexões (que penso que ela, de alguma forma, também terá tido) aqui coloco o meu próprio post, que não sei se incomoda alguém mas, espero eu, que espicaçe alguém!

Amanhã estou de urgência das 8 às 20h (num domingo, sim) mas não pretendo que a dureza da vida me afaste de ninguém.

Beijinhos a todos

Under the bridge

For all of you who feel lonely from time to time...


Angústias que aqui vos trago

O dia chega ao fim. Um fim, que de tanto esperado, devia ser recebido com alegria e alívio! Mas não, é apenas um novo recomeço. Enquanto os olhos não se fecharem, a face gentilmente colocada na almofada suave, uma torrente de coisas disputam a minha atenção. Coisas nas quais não quero pensar.

A vida repete-se de forma irónica, uma grande e perene raiz que irrompe do caminho e onde tropeço, inúmeras vezes, como num sonho perverso.

Só tenho de me transformar, é só isso! Mudar e adaptar-me, que aos outros só o seu umbigo interessa.


Novo blog!

Boa noite a todos :)

Hoje a minha mensagem é curtinha. Construí um novo blog, muito simples, cujo objectivo é a partilha de conhecimento, nomeadamente conhecimento médico mas tudo o que achem interessante e que contribua para a nossa cultura geral.

Já mandei convites e por isso toca a postar no novo blog.

Espero que gostem da ideia!

O Paradoxo da Enfermaria de Medicina

Lamento estar hoje a escrever sobre tema tão deprimente mas, bem, temos de ser coerentes com o nosso próprio humor e por isso penso que hoje seria de uma extrema hipocrisia escrever noutro tom que não este.

A verdade é que, tenho reparado, nestas horas passadas na enfermaria de Medicina, que a maioria dos doentes vai piorando à medida que o tempo passa e não o contrário. Às vezes sinto-me num daqueles filmes em que o protagonista pára no meio de um corredor e de repente tudo em volta começa a desenrolar-se em câmara lenta, as vozes imperceptíveis a arrastarem-se, os movimentos lentos e as cores meio baças. É nestes segundos que penso: o que estão estas pessoas a fazer aqui, nestas salas de morte lenta, sós entre cortinas e algálias e carrinhos de enfermagem e pessoas de bata que de forma mais ou menos banal fazem disto o seu local de trabalho.

O que estão estas pessoas a fazer em macas nos corredores, umas atrás das outras, empilhadas, sem um pingo de privacidade, as suas queixas a perderem-se no ruído de fundo, as suas almas a perderem-se no cinzento angustiante das paredes.

E quando eu semi-corri para a sala do fundo para dizer à minha doente que ia ter alta e que ia finalmente voltar para casa, ela sorriu e abraçou-me e eu juro que entendi tudo. Nos dois dias anteriores morreram duas pessoas na mesma sala e não era um dia inédito.

Neste sítio onde é suposto curar e aliviar, a morte e o sofrimento são as coisas menos inéditas.

Adeus...

E na verdade não é o medo da morte mas sim o medo de morrer...


Neverending Tese



Inacreditavelmente, contra um milhão de adversidades lideradas estoicamente pela mais íntrinseca e perigosa de todas que é a preguiça a minha tese avançou! É verdade! Já tem tabelas, está mais bem estruturada e já se parece com um documento útil para consulta e esclarecimento.

E como não deve haver post sem um propósito superior deixo-vos um site indispensável para quem anda nisto cuidados paliativos.

É um site com a assinatura do Dr. Robert Twycross, "guru" dos cuidados paliativos.

Um obrigado especial à Aninha pelo livro: e eu que não estava a querer trazê-lo comigo, que bem fiz em não cair nessa asneira!

Olá!

E meses depois aqui estou para dar mais qualquer coisa de mim e dos meus devaneios à blogosfera!

E para oferecer alguma coisa neste meu recomeço deixo aqui uma música que me inspira, e que me ajuda quando de facto me sinto "a carregar o mundo nos meus ombros"!





"Hey jude, dont make it bad.
Take a sad song and make it better.
Remember to let her into your heart,
Then you can start to make it better.

Hey jude, dont be afraid.
You were made to go out and get her.
The minute you let her under your skin,
Then you begin to make it better.

And anytime you feel the pain, hey jude, refrain,
Dont carry the world upon your shoulders.
For well you know that its a fool who plays it cool
By making his world a little colder.

Hey jude, dont let me down.
You have found her, now go and get her.
Remember to let her into your heart,
Then you can start to make it better.

So let it out and let it in, hey jude, begin,
Youre waiting for someone to perform with.
And dont you know that its just you, hey jude, youll do,
The movement you need is on your shoulder.

Hey jude, dont make it bad.
Take a sad song and make it better.
Remember to let her under your skin,
Then youll begin to make it
Better better better better better better, oh.

Na na na na na ,na na na, hey jude..."


E os Beatles têm este estranho condão de me fazer sentir comovida e feliz ao mesmo tempo, como se o mundo fosse um sítio diferente e místico!


Frustração

Vou contar-vos uma história em que qualquer semelhança com a realidade da Faculdade de Medicina de Lisboa não é DE TODO pura coincidência:

Era uma vez dois irmãos que frequentavam o curso de Medicina de uma Faculdade localizada na cidade-capital de um país à beira mar plantado.
Um dia, os senhores da tesouraria/repartição académica dessa maravilhosa faculdade decidiram que o aviso de pagamento das propinas deixava de ser feito através de carta e passava a ser feito pela internet, duma forma muito moderna e actual. Ora, tudo estaria bem nesta historinha se os ditos senhores conseguissem dominar minimamente o mundo da informática e se usassem assim um bocadito daquela capacidade humana que é a racionalidade para entender que talvez fosse melhor haver um plano B além do pagamento pelo site, para o caso de acontecer algum problema.
E um dia, aconteceu mesmo o que se esperava. O pagamento da propina calhou no meio da época de exames e, como ninguém manda cartinha a avisar os dois irmãos esqueceram-se. Dois dias antes do prazo acabar alguém se lembrou de enviar um mail a relembrar os esquecidos e alguns colegas mais generosos fizeram o mesmo através de sms.
Posto isto e com o prazo a acabar, os dois irmãos decidiram tratar logo do assunto das propinas e foram ao site da faculdade, essa pérola da informática. Ora não é que o site estava bloqueado para reconstrução ou por um erro fatal ou qualquer coisa que o valha!!! E agora?
Bem, os irmãos decidiram ir directamente à tesouraria resolver o problema, pedindo a entidade e referencia para o pagamento. Mas.... eis que o enredo se complica um pouco mais e a doce senhora da tesouraria informa os irmãos que não pode dar essa informação, esses dados só podem ser obtidos online! Mas - protestam os irmãos - o site está bloqueado há horas!. Eu sei - diz a senhora com o mesmo patetico sorrisinho - mas não posso fazer mais nada.
E os irmãos voltaram para casa, crentes que no dia seguinte, o ultimo dia do prazo, o site estaria funcional.
No dia seguinte, verificou-se que o site esteve funcional durante uma horazita ou duas de manha, mas como era necessária password para ver as referencias e só um dos irmaos estava em casa quando isso aconteceu só um deles conseguiu obter os dados. Quando o outro irmão voltou "puff" já estava o site morto novamente e assim ficou até à meia noite (muitos refreshs depois!).
No dia seguinte (que é hoje) já com o parzo terminado um dos irmãos decide ir à tesouraria logo depois de almoço resolver o problema e perguntar se vai haver multa mesmo depois de toda esta aventura aqui descrita.
Eram perto das duas da tarde quando se depara então com o aviso na porta: excepcionalmente às 4as a tesouraria está aberta só das 10 à 13H.
Uau!!! Que horário maravilhoso!!! Útil para resolver os problemas dos alunos (é para isso que eles existem certo? ou é para entreter os funcionários entre os horários das novelas??hum... fica a dúvida).
Ora bem, o irmão não desiste e bate à porta na mesma. Há movimentação lá dentro. Alguém se aproxima da porta. O irmão diz que precisa de falar com alguém com urgência por causa das propinas. O alguém do outro lado da porta diz: Não temos chave, não posso abrir.
Fantástico!! Muito credível!! Os funcionários são trancados lá dentro tipo Consílio do Vaticano... Ninguém tem chave... LOL deve ser isso deve.
Triste o irmão liga para casa a avisar a irmã das suas desventuras. A irmã, revoltada, interrompe a odiosa endocrinologia para procurar o contacto da tesouraria ou repartição no site da faculdade para mandar um mail de indignação. Mas, apesar de o site já estar a funcionar (yeah, agora que já não é preciso) não existe contacto electrónico para estas entidades!! Existe para todos os serviços do hospital, para todos os gabinetes de investigação, provavelmente até para o armário das limpezas mas para a secção académica não!
Portanto resolve-se tudo exclusivamente pelo site excepto aquela parte de ouvir os problemas dos alunos, essa parte resolve-se pessoalmente e mesmo assim não se deve resolver porque ou estão fechados ou dão-nos com o estore na cabeça como já aconteceu noutra ocasião.

Peço desculpa por todo este desabafo, mas isto é uma palhaçada!

Era dos Tweets!

"Twitter é uma rede social e servidor para microblogging que permite aos usuários enviar e ler actualizações pessoais de outros contactos (em textos de até 140 caracteres, conhecidos como "tweets"). As actualizações são exibidas no perfil do usuário em tempo real e também enviadas a outros usuários que tenham assinado para recebê-las. O serviço é grátis na internet."
(adaptado de Wikipédia)

Convido-vos a inscreverem-se. Demora só uns dois minutinhos e uma das coisas giras é tentar encontrar pessoas conhecidas no twitter, ver como é o dia-a-dia deles e, quem sabe, passar a fazer parte da lista de pessoas que eles seguem!

Fora este fascínio pelas personalidades mediáticas, o twitter vale pela oportunidade de a qualquer segundo podermos desabafar àcerca das pequenas coisas e construir os nossos dias com pequenas frases que, ao fim de algum tempo, constituem uma mini mas fascinante auto-biografia.

Procurem e encontrem-se no Twitter!

2º Centenário

Olhando para a pequena imagem no canto superior direito do meu blog analiso os pormenores.

Um caminho de terra batida em campo aberto, o céu azul claro, as nuvens dispersas. Aqueles dois trilhos que derivam do principal, o primeiro rumo a uma espécie de casinha de hobbit com aspecto pitoresco e outro rumo ao desconhecido, ao infinito ou, se preferirem, ao fundo preto do blog.

Cena retirada de um filme de desenhos animados, ou de uma cena de Senhor dos Anéis, ou de um agradável sonho nosso, ou de um conto infantil ou de um dos níveis do jogo Mario 64... Quem sabe?

A verdade que ninguém pode discutir é que, onde quer que este pequeno e idílico caminho vá dar, o post que agora eu escrevo e vocês lêem é o post número 200.

A todos que caminham comigo neste trilho imaginário o meu obrigado, porque todos juntos levamos palavras e opiniões ao mundo inteiro, projectamo-nos a partir do nosso minúsculo cantinho neste pedaço de chão até locais que nunca poderemos pisar de verdade.

Lembrete!

A todas as pessoas por esse mundo fora a quem isto se possa aplicar por favor leiam com atenção:

"Se não têm nada de agradável ou pertinente para dizer permaneçam calados."

"Todos somos de algum modo imperfeitos por isso lições de moral de algibeira e abusos de confiança são francamente dispensáveis."

Obrigado.

Novo Sol

Felizmente, os maus dias e as más semanas terminam.
De rompante ou de mansinho, deixando para trás uma certa sensação de amargo na boca.

Certamente vou adormecer com o desejo de que o sol de amanhã traga um novo ciclo de coisas boas.

Politiquices

Hoje José Sócrates deu uma entrevista televisiva.
Começo já por dizer que não vi, não por qualquer radical oposição contra o senhor PM mas porque me esqueci que ia dar e porque estava (para variar) a resolver umas coisas da faculdade.

Quando liguei a TV para criar banda sonora para o meu tardio jantar, estava já a equipa de comentadores da Sic Notícias a comentar a dita intervenção. E, devo dizer, que me diverti a ver aquilo. Percebi a diferença entre conteúdo e forma em política. Entendi (aquilo que já desconfiava) que rapidamente se passa de bestial a besta e vice-versa. Fui relembrada das centenas de versões já propostas para o trajecto do TGV e, finalmente, alguém em televisão materializou aquilo que eu sempre pensei: sempre que os partidos trocam de lugar, entre Governo e Oposição, mudam automaticamente de opinião sobre tudo. Entendi ainda que Sócrates está "sozinho numa estrada sem regresso" e que os portugueses são um povo assim um bocado apático que tem muita garganta para criticar mas no fundo está sempre à espera que os outros resolvam por ele e que as coisas se desenrolem a seu proveito sem ser necessária a sua intervenção pessoal.

Na política, como na faculdade e na vida em geral estes jogos de poder são interessantes e complexos.
Para terminar, concordemos ou não com ele, deixo aqui uma referência ao Ricardo Costa, o comentador político da Sic, que faz sempre comentários muito inteligentes e espirituosos e gosta de pôr o dedo na ferida.
Saudações mais ou menos políticas a todos!

Este domingo...



Todo o contexto em que este domingo se avizinhava sugeria que ele iria ser assim monótono, interminável, abafado e sensaborão.

Depois de uma semana de feriados e pontes em que abusámos do absentismo, do calor opulento e dos passeios por aqui e acolá eis que o domingo seria aquele dia fatídico, véspera do trabalho, em que os deveres não cumpridos devem mesmo ser concretizados.

E ele chegou, com um estranho calor de estufa, o céu cheio de nuvens teimosas e cinzentonas que parecem lembrar-nos que esta é a última oportunidade para fazermos todas aquelas coisas que têm de estar prontas para o início da semana.

Nada pude fazer além de cumprir. Mas que tortura! Tenho quase a certeza que hoje preencho critérios para episódio depressivo major, tal é a anedonia, a lentificação e a tristeza que me preenchem desde a ponta do cabelo até aos dedinhos dos pés.

Esta interminável história clínica, aquele monte de artigos, aquele outro monte de anotadas, aqueles abomináveis testes estatísticos, e a minha cabeça de molho neste som de relato desportivo que emana da televisão da sala.

Acho que o calor fez o meu cérebro inchar e agora ele debate-se furiosamente para destruir a caixa craniana. Se eventualmente conseguir o seu objectivo, nada mais terei do que um monte de desértica areia a cobrir o chão e o tampo da mesa.

Digo-vos, perante este domingo acho que até a temida segunda-feira vai saber bem!

Boas-vindas!

Os blogs perderam um pouco o gás dos primeiros tempos.

Acalmou-se a euforia, a novidade instalou-se, criou raízes e transformou-se em mais uma actividade de um presente monótono. Por alguma tendência supersticiosa nasceu em mim a sensação de que o meu antigo template tinha trazido consigo um mau agoiro para a dinâmica dos blogs (meu e blogues amigos) e que, portanto, era urgente mudar de template para tentar afastar os maus espíritos e regressar aos antigos tempos aúreos da blogosfera local.

Vamos lá ver se resulta. Por enquanto continuam os aperfeiçoamentos estéticos e os pormenores.

Bem-vindos ao renovado "Através do Espelho"!

A Gaiola




Onde nos perdemos?

Onde nos reencontramos?

Cada decisão aproxima-nos de algo que desejamos e afasta-nos de coisas que tínhamos como garantidas. E às vezes dou por mim, cambaleante, com medo que o baralho de cartas caia sobre si próprio, receando dar o passo em frente e evitando ao máximo dar um passo para trás.

Tudo o que aqui figura, de forma mais ou menos explícita, mais ou menos pensada, mais ou menos consciente, é tão auto-biográfico que me assusto... Comigo própria, com as interpretações, com a multiplicidade de siginificados que cada palavra transporta.

Neste ciclo infindável de acções e pensamentos, interdependentes, incessantes, ébrios, custa entender onde ficamos nós, sem cedências nem condicionantes, comandados simplesmente pela vontade própria.

Como é possível que estas mãos fracas tenham construído uma gaiola de aço e vidro?

Rascunho

Não há miséria que não dê em fartura. Que não culmine num "boom" de grandes e engenhosas ideias, tão fantásticas quanto incompatíveis com os deveres quotidianos.

Mas aí está a magia de se ser um simples mortal entre tantos, uma formiga na vastidão dos terrenos humanos, caminhando célere mas autónoma num trajecto milenar. O poder de ser a gota que agita a placidez das águas, ainda que de um pequeno lago, ainda que só por uns segundos.

E quando as palavras não fazem sentido, mesmo quando as relemos ou quando tentamos enquadrá-las na "big picture"... Quando olhamos para dentro de nós, mesmo cá no fundo, e ainda assim permanecemos na ignorância da grande verdade, resta-nos o obediente teclado, a tinta fluida, os habituais e invisíveis ouvintes das desventuras desinteressantes.

E porque acreditamos nos heróis humanos de todos os dias e na pequena estrela que teima em brilhar no sopé de tudo o resto continuamos a afastar os escombros dos fracassos com as mãos nuas e calejadas, até que o sonho utópico da paz se concretize para todos.

Chocolate Quente

A tranquilidade de beber o chocolate quente fumegante, se ele existisse, sentada na desconcertante frescura do chão de madeira, abraçada pela penumbra da madrugada, antevendo nas interrupções da cortina o espectro alaranjado dos candeeiros da rua. Só mais um pouco desse calor líquido, trespassando o meu peito e morrendo no conforto do meu colo. O regresso desejado e agridoce das introspecções solitárias. Imaginados ou reais, estes relatos que não pedem público nem comentário, não pedem nada além do direito de serem expressos, dissolvem-se no chocolate macio, nos lábios sedentos, no cinzento das paredes e no silêncio das horas mortas. São só linhas rectas e ininterruptas, que buscam a fluidez nas ideias. Eu sou tudo o que esta divisão contém, todas as coisas vivas ou mortas em que poiso os olhos e a consciência.

Santo Graal




E quando aquela mística sensação nos atinge, como se o segredo do mundo e da vida pudesse florescer em nós, mais uma vez, tal como fizera em tantos outros ao longo dos anos, dos séculos, dos milénios. Como se todos os problemas fossem a relativização das grandes questões, dos grandes mistérios. Pequeno grão de areia que deseja voar nas dimensões da História, muito além daquilo que se diz ser possível ou real, como se no tempo e no espaço pudessem as grandes revelações ficar gravadas, para sempre, até que alguém chegue para as interpretar.


Como se, na verdade, nada se perdesse, como se tudo fosse um pequeno e impensável milagre, correndo imperceptível debaixo dos nossos olhos, alheio à nossa mente desatenta.

Para quem tem veia de estilista

Meninas e meninos, o blog Através do Espelho tem o maior prazer em apresentar aquele site que devia ter existido quando éramos alegres e imaginativas meninas de 10 ou 12 anos e passávamos algumas tardes a desenhar vestidos e camisolas!

É verdade que este site tem uma população muito jovem de participantes (lol) mas devo dizer-vos que está extremamente bem feito! Podem construir as vossas peças de roupa com opções quase infinitas, fazer a vossa boutique, logotipo de estilista, leilões com as vossas roupas e anunciam nos locais do site que acharem mais convenientes. Tudo isto utilizando o dinheiro virtual do site (excepto para a criação de roupa porque essa parte é totalmente gratuita e extremamente viciante!)
Divirtam-se! Eu ando um bocado "vidrada" nisto lol

A fazer:

Reparemos na ausência de coloquialidades nos últimos dias aqui no blog.
Reparemos também na carência de comments e de movimentações.
Tentemos associar com o fenómeno de "jet lag" de que tenho vindo a padecer desde que regressei de Cuba.
Coloquemos uma mensagem de condolência pelas horas de sono perdidas.
Concluamos algo de extremamente pertinente.

Tentemos, pela milésima vez, adormecer.

Cuba

photo by Sofia


Venho de um sítio onde as coisas seguem uma inexorável ordem e disciplina, rumo a uma inverosímil meta de justiça e igualdade para todos.

Na verdade, e depois de tantos anos volvidos daquele dia em que desceu a serra num tanque blindado, que verá quando se olha ao espelho? Que pensará quando vê as ruas imundas, as casas sem portas, os filhos que pedem esmola nas esquinas? A camisa ensaguentada dos irmãos revolucionários foi comida pelas traças, algures num expositor de museu, enquanto da janela se vêem os estendais das pessoas humildes, nos locais mais inoportunos e inacreditáveis, repletas de t-shirts estampadas com imagens gastas do comandante amigo.

Afinal, o que define os heróis?

A aventura da liberdade é um caminho sem retorno que reclama a vida e a sanidade de quem troca a casa pela floresta e a caneta pela espingarda. Porque às vezes os aventureiros da liberdade, anos depois da revolta consumada, devem ver-se como o reflexo daqueles que odiavam. Num ciclo que parece infinito, em que deixamos de ser quem somos no momento em que conquistamos o desejado objectivo.

Quanto tempo mais para os despojos de mansões, para os "muscle cars" de há 60 anos, para os djambés tocados nas ruas, para os audaciosos "hijos de la revolúcion"?

São os prisioneiros livres. Saudáveis e licenciados vivendo a dois metros da tampa do esgoto.

Será que a história absolve os audazes?

Corropio... (a noite!)

Esta triste mas conhecida cefaleia das horas tardias...

O ser e o não ser que se projectam como sombras na parede, filhas da penumbra que se instala, retratos da vida de alguém que se misturam nos meus.

O perturbador silêncio. Alucinações impossíveis, como clarões coloridos nos meus olhos, uma qualquer embriaguez de sono que desperta a tempestade de ideias.

O vestido verde que não era meu.

Palavras escritas, entrecortadas por tragédias. Vidas que se cruzam sem que se queira.
A total incompreensão destas horas mortas.

Pólen

photo by Doug Santo

O mundo inteiro parece tão grande! Cada um de nós não é mais que um pequeno insecto que se esforça por voar até ao centro da felicidade. Asas de seda tecidas com brio e esperança, ano após ano, em busca do doce pólen da vida!


Ciclovia



Pessoas. Diferentes. Tantas.
De quem gostamos ou não.
Em quem não reparamos
Ou por quem chamamos
Todos os dias.
Pena e alegria de que existam sempre surpresas.

A arrogância fica tão mal.

Esses caminhos a preto e branco
Que não levam a lado algum.

Olhar para dentro não custa assim tanto.

Médicos de Família

É um facto que em breve serão muitos, tendo em conta a enormidade de vagas. No entanto, aquilo que importa saber é se serão bons.

Daquilo que se pode averiguar nas conversas de corredor na faculdade ou mesmo numa discussão mais séria sobre o tema, uma grande quantidade dos alunos de Medicina foge da Medicina Geral e Familiar como o diabo da cruz . Vive-se até um pequeno clima de pânico ao saber que metade de nós, daqui a alguns fatídicos meses, se verá colocado nesta especialidade.

Eu, talvez privilegiada por conhecer o meio por via familiar, tendo a não compreender esta repulsa dos meus colegas. Será porque não tem o prestígio da Cardiologia? Ou a recompensa monetária da Cirurgia Plástica? Será simplesmente porque os nossos "honrados" assistentes hospitalares falam da Medicina Geral e Familiar como se se tratasse de uma terrível fatalidade, um mundo de leigos e totós?

Para todos, como eu, que acham todas estas considerações subterfúgios de gente que não sabe muito bem o que anda a fazer no curso de Medicina (desculpem o radicalismo) será fácil compreender que a Medicina Geral e Familiar é, na sua essência, a mais nobre das especialidades, aquela que exige do médico a plenitude dos seus conhecimentos não só académicos com relacionais.

Questiono-me se esta forma pouco ética que os senhores doutores professores têm de se referir aos colegas de MGF tem como objectivo desmotivar todos os alunos que eventualmente terão de exerce-la como profissão até ao resto das suas vidas?

Por isso reafirmo, sabemos que os médicos de MGF num futuro próximo serão muitos, mas com esta mania colectiva de desprestigiar a profissão que garantia poderemos ter de que serão bons?

Metáfora

Não desapareças já na madrugada fria.

Deixa-te ficar só mais um pouco,
As nossas mãos dadas, invisíveis.
Esse último vestígio do que quisémos ser
Que eu cerro com força para não mais largar.

Não somos mais do que fantasmas,
Nevoeiro fino aos olhos dos outros,
Coisa unilateral sem explicação.

Já sou só uma metáfora jogada ao vento.
Civilização de um ente só.
Sonho de sucessivas noites em claro.

Tempo de mudanças

E porque já estava na hora deste blogue ter um ar mais descontraído, apresento-vos o novo template.

Espero que gostem!

O mundo que temos

Parece que quando chegam as aguardadas férias diminui a disponibilidade mental e emocional para vir publicar alguma coisa de pertinente. Como eu já desconfiava a minha complexa pessoa encontra inspiração nos momentos de maior tensão, desespero e tristeza e aproveita os momentos de descontração e paz para exercer as mui necessárias actividades de preguiça e de aventura ao ar livre.

Assim, depois de uns diazinhos na cidade berço do nosso Portugal (onde sim, encontrei a megastore do calçado Guimarães :p) regressei à capital para testemunhar a incompetência de alguns nossos conterrâneos, que me obrigaram a ficar mais de duas horas na sala de espera do Hospital da Luz. Enquanto desfrutava desses minutos de tédio e revolta decidi cultivar-me um pouco lendo algumas notícias da actualidade mundial e eis que me deparei com algumas coisas que parecem mesmo mentira mas que infelizmente não são. Aqui ficam, para pensarmos todos um pouco sobre isto:

- No Zimbabwe a taxa de desemprego é de 93% (!!) vivendo o país essencialmente de subsídios internacionais. Perante este cenário o que decide fazer o afamado presidente Mugabe?? Gastar 250 mil dólares na sua festa de aniversário! Esta festa incluiu nada mais nada menos do que 2 000 garrafas de champanhe e um banquete para o qual foram sacrificadas algumas dezenas de vacas e cabras!
- Já na Coreia da Norte as últimas "eleições" (cof, cof) determinaram a vitória de Kin Jong-un com 100% (!) dos votos, que veio suceder ao seu pai Kin Jong-il que por sua vez não era visto pela população há alguns anos devido a uma hemorragia cerebral.

Retrato de um domingo caseiro

photo by Sofia

Vida adiada

É triste a falta de assunto que se instala... Durante dias seguidos transformada numa eremita doméstica. Voluntariamente presa entre quatro paredes como se o mundo lá fora não valesse a pena.

A verdade é que se evita pensar no mundo lá fora. Aliás, evita-se pensar. Passa-se do esforço de concentração, das páginas sublinhadas, das noites mal dormidas e das chávenas diárias de café forte para o automatismo do zapping televisivo, o pequeno prazer de uma almofada macia e tantas vezes a simples ausência de olhar um ponto aleatório do espaço.

A voz humana tem um curioso efeito amenizador, como se materializasse o facto de que a vida do resto da população continua independentemente das nossas desventuras pessoais. Uma certa hipocondria invade-me, depois de milhares de minutos a ler exaustivamente sobre as enfermidades do mundo. Os pequenos prazeres, agora imaginados, parecem mais distantes do que as estrelas.

Parece que o sol afinal decidiu dar um ar da sua graça. Poderia sorrir se os meus músculos ainda se lembrassem como esse movimento é feito. Não estou triste, contudo. Parece-me apenas uma hibernação auto-induzida para poupar os meus mais íntimos ideais e sentimentos da frustração de não poderem ser concretizados durante estes dias de estudo.

E invade-me aquela sensação já conhecida de querer prolongar este texto até ao infinito, para que o momento de desligar o computador e voltar às obrigações da tarde de Domingo nunca chegue, fique para sempre adiado enquanto as letras e as ideias escorrem livremente a partir da ponta dos meus dedos.

Trégua

Porque às vezes a poesia me escapa...

Perco a magia única e instantânea dos momentos,
Os meus pensamentos toldam-se de lágrimas,
A minha alma torna-se uma planície estéril e seca,
A vida ultrapassa-me, foge demasiado rápido.

Sou só um vulto debaixo das cobertas,
Procurando um instante de silêncio e de vazio,
Uma trégua da avalanche de futilidades que me cercam,
E me cegam das verdadeiras cores da vida.

Viperina



Alguma vez acordaram de manhã embuídos de um certo espírito viperino, destilando incontroláveis monções de veneno, ansiando não por vingança mas por uma espécie de justiça à escala planetária?

Pois foi assim que acordei hoje, inconsolável perante as agruras da vida e as injustiças de que o mundo se encontra repleto. Sentindo no ar, com minha imaginária língua bifurcada, as más energias e a podridão da sociedade...

E agora pensarão vocês: terá esta recém-transfigurada víbora auto-crítica? Bem, se tiver certamente dará uma forte dentada na própria língua e terá que rastejar agonizante até à Urgência do Hospital de Santa Maria. Até que isso aconteça permaneço com as minhas fantasias de animal de sangue frio, dando poderosas dentadas em todos aqueles que segundo a minha língua bifurcada, merecem.

Esperemos que amanhã acorde na pele de um animalzinho mais pacífico, como um coelhinho, ou uma ovelhinha, ou um golfinho, ou um gatinho... Qualquer coisa que possa terminar em "inho" e que seja mais compatível com a tranquilidade que se exige nestes dias.

Muro da Lamentações

E aqui fica o meu testemunho, infeliz, desesperado e muito pouco racional. Amanhã será um dia tão estranho, em tantas perspectivas, o imprevisível aguarda-me quando o sol raiar, embora bem no fundo eu saiba a sorte que me espera.

Talvez a leitura póstuma deste texto me desperte um sorriso. Talvez amanhã nem tenha energia para vir até aqui e confrontar-me com as minhas palavras de agonia.

Estranha forma de vida esta. Não admira que certas coisas aconteçam quando a exigência nos obriga a este estilo de vida tão pouco saudável.

Não se preocupem com estes devaneios... Amanhã, quem sabe, perderão uma parte do seu significado.

Notícia de última hora!

O meu "árduo" estudo de obstetrícia e ginecologia culminou com esta fantástica e histórica constatação que vem derrubar aquela crença popular de há milénios de que a gravidez demora 9 meses.

Pois é, o tempo considerado normal para uma gestação é de 40 semanas, ou seja, 10 meses! (embora haja, obviamente, um intervalo de valores que se inclui na normalidade).

Acho que merecia mais 0,5 valores por esta constatação, hein?? :p

Valentine´s Day!!!



"And so I'm sailing through the sea
To an island where we'll meet
You'll hear the music, feel the air
I'll put a flower in your hair
Though the breezes through trees
Move so pretty you're all I see
As the world keeps spinning round
You hold me right here right now"

Marés

Dizem que há mais marés do que marinheiros.

É por isso que navegando nós por entre as ingratas vagas da vida, tantas vezes perseguindo as marés ou fugindo delas, constatamos que quando as queremos alcançar elas fogem e quando queremos escapar delas elas multiplicam-se.

Pois, elas são muito mais do que nós.
Resta saber se são todas iguais.
Depois do insucesso consumado, tendo a maré escapado airosamente ou esbarrado de forma violenta contra nós recebemos o sábio conselho, lá está, há muitas marés, não te preocupes que hão-de vir outras mais bonitas ou então, não te preocupes que as próximas marés hão-de ser mais meigas (nesta vida, há versões imaginativas para todo o tipo de infortúnios).

E assim vão e vêem, algo monótonas, as marés e suas ondas brancas e espigadas. Quando morrem limpam a areia de qualquer vestígio seu e descansam, sem medo de nunca mais serem lembradas por nenhum ente vivo neste mundo.

E, no entanto, fica em mim a recordação de ter segurado na mão a espuma do mar, de a ver desaparecer e sublimar-se das minhas mãos geladas e regressar já sem matéria ao leito do oceno. Lembro-me do toque gélido das vagas, abrupto e rude nos meus pés descalços. E elas continuavam a afastar-se furiosamente e enrolavam-se naquele infinito de água sem receio de nunca mais serem recordadas.

E, mesmo assim, eu lembro-me.

Para Ti...

Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo.

Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que talhei
o sabor do sempre.

Para ti dei voz às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só
amando de uma só vida.


Mia Couto

Analogias

photo by Amy Hopp

"As palavras são como as cerejas."

Agora imaginem que eu não gosto de cerejas. Na verdade, o seu sabor súbito e rápido provoca-me um esgar de surpresa desagradável. Tentativas frustradas de gostar pelo menos um bocadinho da fruta que se compara às palavras. Qual será então a sensação de comer uma cereja e não conseguir parar? Será como bombons deliciosos ou bolachinhas mas sem o sentimento de culpa de estar a exagerar nas calorias? Ou será que por ser um prazer consentido (porque dizem que a fruta não engorda) não tem aquele doce travo de pecado e de rebeldia que nos atinge quando ousamos tirar só mais um bombom da caixa? É que às vezes também dizemos só mais aquela palavra, que não devíamos dizer mas que sabe tão bem, aquela que ninguém precisa de saber que dissemos... Como o último bombom da caixa que no final ninguém se acusa de ter comido. E porque às vezes também falamos de mais, surge o arrependimento... Parecido com o leve enjoo e o aumentar de gramas na balança depois de um banquete de docinhos.

Se calhar, as palavras são como os bombons de chocolate...

Dilúvio

Caiu aquela gota.

Sei que a ouvi, muitos andares acima do chão. A primeira gota de chuva. Aquela que anuncia o temporal, o apocalipse de água. Foi só um "pling" inocente, provavelmente caído num beiral de telhado, ou num mosaico da varanda, ou num rebordo de janela. Mas a seguir veio um dilúvio bíblico que varreu a rua de tudo (ou pelo menos era assim que eu imaginava).

Talvez a minha cabeça me estivesse a pregar partidas. Afinal é madrugada e os olhos teimam em contrariar a minha vontade. Se calhar imaginei o primeiro "pling" e os outros todos também. Se calhar se agora espreitar pela janela vão restar apenas umas míseras lagoas de água, baptizando os pneus dos carros e algumas gotas teimosas escorrendo aqui e ali.

Talvez tudo isto fosse só um pretexto para largar tudo e vir escrever, qualquer coisa sem importância que na minha mente surgisse como uma catástrofe natural que era imperativo documentar.

Infelizmente as tempestades imaginárias não levam com elas as obrigações nocturnas e não me consolam do sono, que já pesa. Se me esforçar mais um pouco talvez consiga...

Introspecção de um pássaro


Olhava para o horizonte daquela forma vaga e enigmática, como quem vê o que lá não está ou busca o que não existe. O vento frio do crepúsculo acarinhava as minhas penas macias, nunca tocadas por uma mão humana. Eu não sei se sou pássaro ou árvore ou ar, sei apenas o que os meus antepassados me deixaram, implícito nos genes de que sou feito, explícito nos meus dias de automatismos e rotinas. Os meus olhos na verdade são vazios, guardo apenas o enigma de não saber quem sou, ou de onde vim. Guardo o enigma de não me lembrar dos meus pais ou dos meus irmãos, de ver-me igual a tantos outros e não me questionar acerca da minha individualidade. Não ambiciono grandes conquistas e o horizonte não é mais do que uma paisagem que admiro à derradeira luz de cada dia.

Desconheço a passagem do tempo. Sei que há sol e lua, sei que há tempo dos ninhos e depois tempo das grandes viagens. Reconheço o chamamento ancestral da minha espécie e sei que devo cumprir o desígnio dos que me antecederam. Não temo a morte nem o futuro porque não sei o que são.

Vejo às vezes aqueles assustadores seres de duas pernas, caminhando lentamente em vestes estranhas. Apenas sei que não são como eu, sei que os seus olhos são estranhos e sei que não seguem o prevísivel e incontornável ciclo da vida. Receio as suas figuras grotescas quando se aproximam. Desdenho-os porque não têm asas e porque não respeitam as leis da Natureza.

Sou apenas qualquer coisa viva. Sinto o meu corpo quente e o coração palpitante. Sei que tenho uma pequena grande missão na minha efémera vida. Sei mas não me preocupo. Voo quando está sol e adormeço quando está escuro. De tudo o resto, não sei nada.

Em construção

Desculpem o atentado estético mas já não suportava as paranóias sucessivas do outro template e não tenho tempo agora para renovar o visual.

Brevemente estará mais bonito!

Querem rir um bocadito??

Uma pérola!!! Uma pérola!!! Esta cena do filme "Eraser" com o insubstituível Arnold Schwarzenegger com a qual me deparei a horas tardias na TV e não descansei enquanto não a descobri no YouTube. Aproveitem, delirem com todos os momentos :p

O meu estudo

Alice: And how many hours a day did you do lessons?

The Mock Turtle: Ten hours the first day, nine the next, and so on.

Alice: What a curious plan!

The Gryphon: That's the reason they're called lessons, because they lessen from day to day.


(From "Alice's Adventures in Wonderland" by Lewis Carroll)



Cidade das Meias-Palavras

Na cidade das meias palavras nada é dito por inteiro.

Tudo se presta a mais de uma dúzia de interpretações. As palavras nascem de uma forma e chegam ao seu destino transformadas, adulteradas, alheias ao seu significado original.

São ouvidas e armazenadas em miraculosas redes de conceitos, letras transformadas em impulsos eléctricos, emoções meticulosamente guardadas num mundo de moléculas.
Na ignorância do seu fulcral papel, propagam-se da mesma forma que o ruído dos carros, que a sirene das ambulâncias e que o rítmico pingar de gotas de uma torneira.

Tento lembrar-me das palavras inteiras, fazendo-as revolver todos os circuitos ao meu alcance na busca incessante do baú das memórias definitivas. Incontornavelmente atinjo o cansaço, os olhos pesam e as pálpebras descaem gentilmente como que fechando a porta a mais desvarios, a mais tentativas dolorosas de forçar aquilo que saturou.

Quero deixar de pensar. Por um segundo. Por um milésimo de segundo.

Mas este circuito busca outro, que encontra outro, que se cruza com outros mais, numa intransigente saga de revisitações. O egoísmo de querer estar sempre alerta.

Lembro-me de dar as mãos.
De querer ajudar alguém e não conseguir.
De ouvir calada as ignóbeis injustiças da vida e não poder fazer nada.

Se calhar são tudo meias palavras. Se calhar, simplesmente, não entendi.

Algumas pessoas dançam...




Um, dois, três...
Contagem rítmica do tempo,
Marca-passo do trabalho adiado,
Dos deveres cumpridos,
Das metas desejadas em segredo.


Três, dois, um...
Contagem decrescente da sanidade,
Entidades oníricas flutuantes,
Jogando o jogo do empurra
Até que as pálpebras caiam.


Dedos, autómatos de mim,
Premindo as ideias com força.
Um, dois, três...
Sequência inexorável das horas.


Ponteiros que não voltam para trás.

Incidentaloma!


Boa tarde a todos! :)

Vou começar por vos apresentar a supra renal, esta bela estrutura glandular situada acima de cada um dos nossos rins (aquela massa disforme amarela) que tem a fantástica função de produzir uma infinidade de hormonas importantes. Assim, se alguma desgraça acontecer com a vossa supra renal podem ter problemas variados como por exemplo: ficar com uma bossa de gordura tipo búfalo na parte de trás do pescoço, estrias violáceas espalhadas pela pele, cara em formato de lua cheia ou, também muito interessante, sinais exteriores de feminilização ou masculinização.

Hoje, enquanto estudava a vida íntima da supra renal e todas as formas mais ou menos invasivas de a remover do corpo humano, deparei-me com uma das mais estranhas entidades da Medicina - o Incidentaloma. Como o próprio (e estúpido!) nome indica trata-se de uma massa tumoral da supra renal encontrada por acidente quando se fazia uma ecografia ou TC do abdómen à procura de outra coisa qualquer que não tenha nada que ver com a supra-renal. E depois seguem-se páginas e páginas acerca da abordagem do incidentaloma (tratado portanto como uma entidade respeitável) basicamente retratando a forma como qualquer doutor deve "descalçar a bota" de ter encontrado uma massa inesperada quando andava à procura de outra coisa.

Toda a estupidez inerente a este tema (que me perdoem os estudiosos devotos do Incidentaloma) culmina com esta frase, que passo a transcrever:

"O maior factor de risco para o diagnóstico de um Incidentaloma é a investigação imagiológica do abdómen." - portanto, se não querem ter um cancro do pulmão não fumem, se não querem ter uma cirrose hepática não bebam álcool e, se não querem ter um incidentaloma não deixem ninguém fazer uma ecografia à vossa barriguinha! :p

Inspirei-me na Lua que tu sonhaste

"Dreaming moon" by Nair Diaz


De regresso aos momentos contemplativos.
Quando me faltam os olhos da alma tento entender o mundo que os outros vêem, que os outros sentem e que os outros registam, em imagens eternas compostas por aqueles segundos raros em que as cores da alma coincidem com as cores da noite.

E se agora os minutos se esgotam mais rápido do que a nossa vontade e as tarefas se sucedem sem trégua, não podemos deixar de levantar os olhos e ver as lágrimas e os sorrisos dos outros. As breves nuances de cada um de nós, na individualidade da nossa objectiva, no sentimento único que nos invade quando vemos a mesma extasiante lua que todos os outros.

Perdão por ter roubado esta lua, que todos veremos de forma diferente, mas que será sempre bela. Não deixem nunca de olhar.

Pop Art e muito mais...




Se andam a desesperar à procura de artigos decorativos originais lá para casa desafio-vos a visitar o site da Vertigo Store, que tem loja no Porto e que também vende na internet. Preparem-se para um vasto mundo de arte, de todas épocas e para todos os gostos com preços bastante acessíveis.

E mesmo que não estejam a pensar numa remodelação decorativa para os próximos tempos uma espreitadela a este site é sempre uma forma original de passar uns minutos do vosso tempo.

Mafalda


(sempre sábios lol em qualquer língua...)

Déja vu

A placidez de me encontrar em casa, a temperatura amena, contraste com o clima chuvoso lá de fora... Folhas espalhadas pela mesa, uma confusão organizada de ideias, umas em português e outras em espanhol, tantas verdades que eu devia saber e que se calhar não sei, que eu já li em tempos mas que se perderam na infinidade de conhecimentos que me obrigo a saber.

Estudar em tempos de preguiça e lassidão: tema recorrente das minhas reflexões. Uma sensação que só partilho verdadeiramente comigo própria, quando me encontro só, rodeada por um mundo de apontamentos, informações fugidias e efémeras que me esforço por amarrar com força à minha memória perene e que, tantas vezes, me escapam entre os dedos, de um dia para o outro. A terrível constatação do esquecimento, de querer fazer sempre mais, de não ter bem a certeza daquilo que já se fez.

E vocês que lêem os meus desabafos repetitivos, porque também estas fases de estudo são repetitivas, monótonas e castradoras da imaginação e da originalidade, talvez sintam algo parecido, que partilham convosco mesmo na solidão das horas de estudo.

"Agora fique calada!"

E assim falam as pessoas desbocadas que, algures no mundo da Medicina, buscam um palco para o paternalismo desapropriado.

É por esta senhora doutora e por muitos outros (alguns tão incrivelmente arrogantes) que os doentes têm medo do médico, escondem coisas, não regressam à consulta e não cumprem os tratamentos prescritos.

Quando pensamos na relação médico-doente tendemos a pensar em formas mais eficazes de melhorar a comunicação e a empatia duma relação, que no meu (ingénuo?) entendimento devia ser, por defeito, cordial e respeitosa. Parece que afinal o trabalho começa muito antes, na aprendizagem de que o doente é uma pessoa e, mais ainda, de que as pessoas, de uma forma geral, merecem respeito.

Por outro lado, começo a acreditar que devia haver uma cadeira obrigatória onde fossem correctamente leccionados os príncipios da humildade e do insight. É que ser médico não é ser Deus, ou criatura invulnerável e omnisciente que lança o seu véu pedagógico sobre os seres inferiores que buscam ajuda no consultório. Um médico não é um familiar próximo, não é um encarregado de educação, não é um pedagogo, não é um agente da autoridade, não é juiz, não é um ser inalcansável com múltiplos direitos e nenhum dever.

Para terminar, devo citar mais uma fascinante frase da doutora, referindo-se a um outro doutor, seu mestre na arrogância e presunção: "as pessoas não mudam, nós é que temos de nos adaptar". Portanto se conhecerem uma pessoa estupidamente cruel e desnecessariamente ofensiva mentalizem-se que ela nunca mudará, tentem simplesmente cumprir as suas expectativas ditatoriais e, com sorte, tornar-se-ão no futuro parecidas com ela.

Ou então, como eu, ignorem os comentários odiosos, aprendam com eles e escolham chegar ao fim do dia felizes por terem feito a diferença na vida de alguém, sem desrespeitar os seus direitos mais básicos. É que (para algumas pessoas isto pode ser uma revelação catastrófica!) para se curar ou ajudar alguém não é preciso ser desagradável ou desinteressado.

Tree of life!

by Laurent DeCuyper


A árvore da vida
Nasce num solo improvável.
Onde quer que a fertilidade
Abrace os deuses da criação.

Rectos ramos de seiva bruta
Estendem-se da segurança do tronco
Até onde o Sol os aqueça.

Ainda que o vento os fustigue
Com chicotadas de injúrias e veneno
Oscilam e não vergam porque são eternos.

Sopro gélido de um ente desalmado,
Curto e grosso na sua efemeridade,
Marca mais um anel e morre, para sempre.

Quando fôr quase centenário,
Prodígio no mundo das árvores,
Desdobrar-me-ei finalmente em histórias,
Em papel fino do meu tronco forjadas,
E devolvo-me ao chão onde nasci.

Estamos em Espanha?


Inspirem-se nas imagens e votem na mais recente sondagem!




...

E este é um daqueles dias em que mesmo antes de chegar a casa, enquanto percorria em passo rápido os curtos metros de calçada, imaginava o meu blogue a uma distância cada vez mais curta...


Em pleno desespero pelo encontro com as teclas, desejando que toda esta energia cinzenta me abandone, saia em rajada quando procuro no teclado as letras que me descodificam e as primo com firmeza, sem reler as linhas anteriores.


Fúria que me consome por dentro. Enquanto te uso como saco de boxe literário, escoando as minhas frustrações neste espaço em branco.


Se estivesse sozinha gritaria agora a plenos pulmões até que o chão debaixo de mim estremecesse e a dor aguda nos meus tímpanos me mostrasse que estou viva.

Lusco-fusco


Pela madrugada fora, no lusco-fusco de uma solidão premeditada...

Fuga de ideias

E a vida prossegue de forma pacata... sem sobressaltos apesar do novo ano ter chegado.

O meu sofá, que já era novo em 2008, permanece estático, indiferente a estalos de rolhas, cascatas de champanhe e uivos de alegria.
Pacientemente, abre os seus braços às minhas investidas sonolentas e abraça-me em almofadas e mantinhas quentes.


A TV murmura qualquer coisa sobre atentados e genocídios do outro lado do mundo, num sítio onde certamente não há tempo para celebrações e, concretamente, não haveria qualquer razão para que existissem: Novo ano. A mesma triste realidade.


Gostava de retocar o verniz vermelho mas não tenho paciência. De qualquer forma não consigo estar parada o tempo suficiente para que ele seque em condições. Por isso aqui fico, olhando para as abruptas transições de grená escuro, para os declives e encostas de tinta vermelha.


Por outro lado, reparo que passei do conflito armado para o verniz de unhas sem uma ponta de remorso, como se existisse uma qualquer associação pérfida entre sangue e verniz vermelho. Ou simplesmente a constatação da banalidade da morte, do massacre e do sofrimento, da pequenez de cada um de nós perante um mundo que, independentemente dos anos que passam, caminha para a desumanidade.



"Humanidade sintetiza as características partilhadas por todos os humanos, especialmente a capacidade do Homem para ser compreensivo e benevolente."

Nós, os humanos, estaremos extintos antes de desaparecermos. Deixaremos de ser humanos e passaremos a ter uma outra designação mais honesta, mais adequada à nossa natureza auto-destrutiva enquanto espécie.


E, assim, como em todos os anos, enquanto o Mundo parece caminhar para a calamidade total, cada um de nós, na sua microscópica existência, debate-se com todas as forças para ser feliz.


Do alto da minha cadeirinha falo para um gigante Universo de meia dúzia de pessoas... Sempre com a esperança de que as palavras possam mover pequenos grãos de areia ou grandes montanhas.



Parafraseando aquilo que já na minha infância parecia fazer sentido: